A NEGAÇÃO DOS DIREITOS CONSTITUCIONAIS AOS POVOS INDÍGENAS DA CONTEMPORANEIDADE: invisibilização e violência estatal
Palavras-chave:
povos indígenas, garantias constitucionais, violência física e jurídicaResumo
INTRODUÇÃO:
Sabe-se que o Brasil inicia sua história com a colonização dos portugueses no território brasileiro, que possuía neste local uma pluralidade de povos indígenas, desde os tempos mais remotos. Neste contexto de exploração, os portugueses, em busca de riquezas, utilizaram o modelo escravagista para se apoderar da mão de obra indígena e expandir sua economia. Logo, pode-se observar que a segregação indígena existe desde o primeiro contato, distinguindo-os em termos de raça e inferiorizando-os como seres sem alma e, portanto, sem cultura.
Tem-se, historicamente que o homem necessita de uma comunidade para alcançar sua completude. Consequentemente, avalia-se o homem como um animal político por natureza, considerando um dos fundamentos antropológicos de Aristóteles em sua obra “Política”. Pensando assim, é possível identificar e relacionar a lógica da vida comunitária indígena versus a do homem branco de caráter marcadamente individualista. Nessa direção, e para garantir seu modelo de vida coletiva, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) estima existir aproximadamente 100 povos indígenas isolados na floresta amazônica brasileira. Tal isolamento teria como finalidade evitar invasões em suas terras, a transmissão de doenças e a interferência destrutiva em suas culturas.
O conteúdo anterior se justifica pelo fato de que, com o advento da globalização, no final do século XX e início do século XXI, ocorre um novo choque cultural para as comunidades indígenas, dada a característica de aprofundamento internacional da integração econômica, social, cultural e política. Com esse processo, se retoma o menosprezo à cultura indígena, estigmatizando-a como não produtora de desenvolvimento econômico, além de, através da mídia, fazer como que a sociedade brasileira assimile tal conceituação.
E é sobre essa temática que o trabalho irá discorrer.
METODOLOGIA:
A produção deste trabalho se deu por meio da pesquisa bibliográfica, legal e documental. Em termos metodológicos, se optou pela investigação qualitativa, na medida em que se pode demonstrar os nós górdios do Estado quando se trata da proteção dos direitos dos povos indígenas.
RESULTADOS E DISCUSSÕES:
Na perspectiva de trabalhar a problemática dos direitos dos povos indígenas considerando os enfrentamentos contemporâneos, se promoveu encontros semanais de leitura e discussões em torno do tema, resultando na produção textual de conclusões parciais, quando se realizou a identificação e apresentação de problemas-chave atuais ligados à demarcação de terras e à preservação ambiental das comunidades indígenas. Isso posto, se diagnosticou uma séria omissão estatal, por um lado, na medida em que não garante os direitos destes povos, bem como a sua comissão, enquanto fecha os olhos para ações de violência, muitas vezes ocorrida com o aval das instituições estatais, na medida em que não efetiva direito demarcatório de suas terras, o que se poderia identificar como a violência não somente física, mas também jurídica, impedindo tais comunidades de realizar sua cultura e de preservar o meio ambiente, ao não demarcar seu território.
Em uma análise conjuntural, o indígena é visto como não produtivo para o Estado brasileiro e para o sistema capitalista, de tal modo que segue o assédio para integrá-lo à sociedade, com a nítida percepção de fazer desaparecer sua história e modo de ser-fazer-viver.
Por outro lado, contudo, é ocultado à sociedade brasileira que a sustentabilidade origina e prospera no meio ambiente indígena,
Os Povos Indígenas têm cuidado incessantemente da Mãe Terra e da humanidade. Nós queremos continuar a fazer isso, com o apoio dos povos do mundo. Enquanto Povos Indígenas, nós estamos aceitando a responsabilidade designada por nossas profecias para dizer ao mundo que nós devemos viver em paz uns com os outros e com a Mãe Terra, para garantir harmonia dentro da Criação e de acordo com as leis naturais da Mãe Terra (A DECLARAÇÃO DA ALIANÇA DOS GUARDIÕES E FILHOS DA MÃE TERRA, 2017, preâmbulo).
Reforçando a temática, e conforme Davi Kopenawa, na obra “A Queda do Céu”,
Na floresta, a ecologia somos nós, os humanos. Mas são também, tanto quanto nós, os xapiri, os animais, as árvores, os rios, os peixes, o céu, a chuva, o vento e os sol! È
tudo o que veio a existência na floresta, longe dos brancos; tudo que ainda não tem certa. As palavras da ecologia são nossas antigas palavras, as que Omama [o demiurgo yanomami] deu a nossos ancestrais. Os xapiri defendem a floresta desde que ela existe. Sempre estiveram do lado de nossos antepassados, que por isso nunca a devastaram. Ela continua bem viva, não é? Os brancos, que antigamente ignoravam essas coisas, estão agora começando a entender. È por isso que alguns deles inventaram novas palavras para proteger a floresta. Agora dizem são a gente da ecologia porque estão preocupados, porque sua terra está ficando cada vez mais quente. [...] Somos habitantes da floresta. Nascemos no centro da ecologia. (KOPENAWA, 2015, p. 16).
O direito ao meio ambiente sustentável, se elevou à categoria de Princípio de Direito Ambiental, dentro dos Direitos Humanos de 3° geração, sendo indispensáveis ações de preservação para a vida das presentes e futuras gerações, como discorre o artigo 225, CF/88. Tem-se, portanto, que os povos indígenas representam fundamental parcela da população brasileira quando se trata da sustentabilidade ambiental. Os índios apresentam uma familiaridade singular com a natureza, mantendo uma relação afetuosa como se a Terra fosse sua pachamama. São eles os responsáveis pela manutenção da natureza no que diz respeito ao desenvolvimento sustentável. Segundo Lévi-Strauss (1973 apud KOPENAWA, 2015) não são apenas os índios, mas também os brancos, que estão ameaçados pela cobiça de riquezas, quando todos serão arrastados pela mesma catástrofe ambiental.
O branco trata a natureza de modo predatório. Consome do planeta mais do que ele pode oferecer. Destrói as montanhas, as nascentes, os lagos, as Áreas de Preservação Permanente para extrair minérios, envenena as águas etc.
Retomando a temática da demarcação, diz Davi Kopenawa (2011, p. 36), “Quem ensinou a demarcar foi homem branco. A divisão de terra, traçar fronteira é costume de branco, não do índio”. Em 1988, com o advento da nova Constituição Federal, impõe-se a necessidade de demarcar as terras indígenas, informando ser dever do Estado delimitá-las. Nesse sentido, o art. 231, parágrafo 1º, CF, diz que
São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
Conforme o art. 67 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias “A União concluirá a demarcação das terras indígenas no prazo de cinco anos a partir da promulgação da Constituição”, se esperando que os territórios indígenas fossem demarcados para o uso exclusivo desses. Trinta anos se passaram e a lei não foi cumprida.
Contraditoriamente, essas terras são invadidas e exploradas economicamente de modo predatório, citando-se como referência os territórios indígenas do Centro-Oeste, onde o latifúndio é a tônica. Invasões violentas que resultam em mortes, escravidão e expulsão dos indígenas de suas terras, a exemplo do que ocorreu com a etnia Guarani Kaiowá, no Mato Grosso, em 2012, e segue ocorrendo em outras comunidades.
Esse contexto representa a análise do atual cenário de violência político-jurídica estatal contra os povos indígenas, que necessitam da demarcação territorial para manter sua cultura e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações.
CONCLUSÃO:
Durante a leitura, debate e confecção do presente trabalho, identificou-se que os povos indígenas sofrem duros reveses pela ausência de políticas estatais, por um lado, e sofrem com o aumento da violência física e jurídica, por outro. Paradoxalmente, tais povos são os verdadeiros guardiões da natureza e os responsáveis pelo tratamento adequado pela terra. Todavia, sofrem constantes ataques por parte dos não-índios, que o fazem visando ampliar o agronegócio e o capital que o mesmo gera, como falácia de que a mesma elevaria a economia brasileira. Falácia esta comprada pelos meios de comunicação, o que acaba aprofundando a violência da sociedade contra as comunidades em questão. Dessa forma, diagnosticou-se a não efetivação dos direitos indígenas, que durante anos vem lutando em prol de suas conquistas legais abstratamente expressas na Constituição Federal/88, mas que, na prática, ficam invisíveis na sua concretude. Interesses de determinados grupos, atendidos com auxílio governamental, visam apenas fortalecer e aumentar sua margem de lucratividade, o que acaba por mitigar, invisibilizar e violentar os direitos destes povos que lutam para garantir para si e para as futuras gerações.