Doutrinação e Dogmatização em Sala de Aula

Autores

  • CAREN OTONI
  • Marcelo Thalles da Silva Lima
  • Thiago Brito Steckelberg

Palavras-chave:

Doutrinação em Sala; Escola sem Partido; Dogmatização

Resumo

Platão, em seu livro “A República”, entrelaçava a política ao ensino: dividia as funções de
trabalho pela capacidade de cada indivíduo, divisão esta que seria realizada no período de educação
das crianças e também reforçada pela própria educação. Comumente presenciamos discussões
relativas a postura do professor e sua intervenção frente aos alunos. Por vezes carregadas de opinião
e sentimentalismo, deixando de lado a grade curricular, excedendo o limite da estimulação do senso
crítico, alcançando a doutrinação ideológica. Tal postura reflete uma determinada concepção da falta
de preparo, ou falta de maturidade de professores lidarem com a sala de aula.
Todos os grupos sociais, como escolas e universidades, tem origem e funções estratégicas
para a economia, geram paralelamente um ou mais grupos de intelectuais, dando consistência e
consciência de sua função para diferentes campos de atuação, como o social e o político, além do
econômico. Estas lideranças são fundamentais na busca por uma nova ordem vigente para a
sociedade a partir de um grupo social progressista. Por outro lado, estes mesmos intelectuais podem
se alinhar com a classe dominante, auxiliando-a na manutenção da hegemonia, através da difusão das
ideias dominantes.
Professores carregam o posicionamento de intelectuais, alcançando a admiração de seus
docentes. Mesmo que não seja a intenção do professor, ele influencia. Para tanto, há a necessidade de
se conhecer a responsabilidade que é a docência, não confudindo termos como doutrinação e
dogmatização.
Para Gramsci (1966, 1978, 1995), os intelectuais são detentores e produtores de um discurso que
influencia a organização da sociedade e da cultura, pois as pessoas só se tornam independentes ao
organizarem-se, e não há organização sem intelectuais, "sem organizadores e dirigentes, sem que o
aspecto teórico da ligação teoria-prática se distinga concretamente em um estrato de pessoas
"especializadas" na elaboração conceitual e filosófica." (Gramsci, 1966, p. 41).
O docente, ainda que não perceba e se imagine o pólo irradiador que manipula os cordões
invisíveis da arte de forjar consciências, também é influenciado.
Há demasiados casos de professores com interesses políticos específicos que se submetem ao
sistema educacional, mesmo quando este indivíduo não está de acordo com as vertentes que o
empregam, e usam da sala de aula como palanque ou momento de desabafo.
2
Como escreve Paulo Freire: “Não posso ser professor sem me pôr diante dos alunos, sem
revelar com facilidade ou relutância minha maneira de ser, de pensar politicamente. Não posso
escapar à apreciação dos alunos. E a maneira que eles me percebem tem importância capital para o
meu desempenho.”(Freire,2009, p.96). A fala do professor não é isenta de valores, concepções,
preconceitos, crenças, ideologias, etc. O discurso que se afirma imparcial atropela a ética. “Não
posso ser professor se não percebo cada vez melhor que, por não poder ser neutra, minha prática
exige de mim uma definição. Uma tomada de posição. Decisão. Ruptura. Exige de mim que escolha
entre isto e aquilo.” (Freire,2009, p.96) .
Não existe imparcialidade na educação. O educador, não ensina aquilo que diz, transmite
aquilo que é. Um posicionamento não pode ser visto como tentativa de lavagem cerebral nos alunos,
mas sim como a ratificação de que nossas vidas são feitas de escolhas. A escola deve ser um espaço
permanente de debate de ideias e concepções, cuja essência não seja preparar jovens para a
cidadania, mas o próprio exercício dela, aumentando o senso crítico para a vida e interpretações
sociais.

Referências

Gramsci, Antônio. Concepção Dialética da História. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
1966.Obras Escolhidas. São Paulo: Martins Fontes, 1978.
Os Intelectuais e a Organização da Cultura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1995.
Mannheim Karl. Sociologia da Cultura. In: FORACCHI, Marialice Mencarini (Org.). Karl
Mannheim: Sociologia - Coleção Grandes Cientistas Sociais - vol. 25, p. 101 - 106. São Paulo: Ática,
1982. Ideologia e Utopia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986.
QUINTANEIRO, Tania. Um toque de clássicos: Marx, Durkheim e Weber. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2002, p. 98.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São
Paulo: Paz e Terra, 2009, p. 96.
BINETTI, Saffo Testoni. Doutrina. In: BOBBIO, N. et al. Dicionário de Política. Brasília:
Editora da Universidade de Brasília, 1992, p. 382.
CERLETTI, Alejandro A.; KOHAN, Walter O. O professor de filosofia e a filosofia.. Disponível em:
https://www.programaescolasempartido.org/projeto <acesso em 01 de fevereiro de 2019>

Publicado

2019-12-16